segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Alheiras de Mirandela (2)

Antes de mais, que as coisas sejam bem claras. Para fazer boas alheiras, a carne deve ser de qualidade.
O porco, criado em casa tem a vantagem que não só não acarreta custos complementares para o produtor mas também permite de ter um gosto diferente já que o animal come quase de tudo. Batatas, milho e outros cereais, castanha, legumes e restos das refeições da família, dão um sabor único á carne das raças criadas em Trás-os-Montes.
Convém também que as galinhas, os patos e os perús sejam também de produção caseira.
Se a matéria prima não for de qualidade, as alheiras também não o serão.
O fabrico das alheiras começa sempre no dia anterior. Matam-se as galinhas, os perús e os patos, corta-se o pão ás fatias e põe-se numa grande caldeira de cobre. Hoje também já se utilizam caldeiras em alumínio.
No dia seguinte, logo de manhã cedo, acende-se a fogueira e põem-se os potes de ferro ao lume. Começa então uma longa cozedura das carnes que dura várias horas. O objectivo é que não só as carnes cozam mas que também a água tome todo o sabor da carne para depois difundir o sabor intenso no pão. A mistura do gosto das aves e da carne de porco (sobretudo dos ossos da suã) é uma grande parte do segredo das boas alheiras.
Quando cozidas, desfiam-se as carnes, o que leva bastante tempo.
Depois, deita-se a calda (é o nome que se dá á água que serviu para cozer as carnes) por cima do pão, junta-se lhe o alho picado, as carnes, deita-se muito azeite "a cantar" (isto é bem quente) e o colorau para dar gosto e cor.
Antes de tudo isso, põem-se de lado as sopas (o pão só com o molho da calda)
ás quais se juntam pedaços de carne para que a família possa comer mas também para dar aos amigos. No dia das alheiras, levam-se as sopas aos familiares e amigos como é tradição. São então travessas de sopas que vão de uma ponta á outra da aldeia.
A matança do porco e os dias que seguem são momentos de festa e de fartura e têm as suas regras e usos.
Depois de misturado tudo, com uma grande colher de pau, desfazem-se as sopas até ficar numa massa untuosa.
Começa então a fase de meter essa massa nas tripas de vaca. Com uma fulineira, um ustensílio parecido com un funil mas muito mais curto, depois de a entroduzir na tripa, empurra-se a massa com uma colher e faz-se avançar a massa espremondo a tripa até que chegue á outra ponta e isso até encher a tripa por completo.
Entrega-se então a outra pessoa que vai atar com un fio de algodão e depois cortar a tripa em pedaços de cerca de vinte centímetros. Aí está a alheira !
Ao fim do dia, já bem tarde, põem-se então a secar, em varas postas por cima da lareira, as largas duzias de alheiras que foram feitas durante o dia.
O fabrico das alheiras é trabalho de mulher. E preciso muita paciência e muita experiência para fazer as alheiras. A trabalho é muito e quando se prova uma boa alheira, o sabor é muitas vezes proporcional ao trabalho que ela deu para fazer. E como lhes disse no meu post anterior, ao amor com que foi feita.
O resto, é o trabalho do calor e do fumo do fogo que arde na lareira durante vários dias. E para isso, até a lenha é escolhida. Qualidade até ao fim.
Bom proveito !

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