segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Ai que saudades...

O dia 2 de novembro é o dia dos fieis defuntos, como todos sabemos.
A tradiçao é, nesse dia, de ir ao cemitério para rezar pela alma daqueles que, apesar da morte, estão próximos de nós.
Falo-vos de morte mas a morte não existe. Nunca morrem as pessoas que ama-mos, que ficam para sempre no nosso coração.
A morte é só um estado físico, como qualquer outro momento da vida. Os mortos estão junto de nós, os seus espíritos acompanham-nos em toda a parte e a visita que fazemos ao cemitério no dia 2 de novembro é apenas para lhes lembrar que os corpos estão ali, para sempre.
Ir ao cemitério, levar flores, lavar campas e mesmo chorar até não ter mais lagrimas, verdadeiras ou falsas, não tem importância nehuma para os mortos.
O que é necessário é estimar as pessoas enquanto estão vivas, porque depois o sal das lágrimas até seca as flores mesmo no inverno.
No meu caso, não preciso do mês de novembro para me lembrar dos meus mortos. Tenho saudades deles e lembro-me sempre deles com carinho.
Vem-me muitas vezes à memória a minha avó Carlota, a minha avó Florinda e a minha avó Miquelina. Sim, tive sorte de ter três avós. Amaram-me as três e eu também as amei.
Por vezes sofro de não ter visto o que se passou no fim da vida de uma delas, e revolto-me contra mim mesmo por não ter posto fim ao seu sofrimento.
Também me lembro dos meus avôs, o Albino e o Meireles, assim como do que não conheci, mas que inventei logo desde pequeno, o meu avô Joaquim.
E também me lembro dos meus amigos, ou dos amigos da minha família. O ti João Borges e a tia Beatriz, por quem tinha muito carinho embora não fossemos família directa. O ti Jaime também, por casa de quem andava muito quando garoto e que foi embora ainda tão novo.
Da Dona Aurora e do Sr Pinto, os meus vizinhos de que lhes falarei um dia. Da tia Imperatriz, do ti Adriano, da tia Belmira, do ti Arnaldo, da tia Corecha, do ti Zé Cadavez e da tia Zulmira, da Dona Olivinha, do ti Zé Carvalho, do ti Francisco Cadavez, da tia Aurora Borralha por quem tinha muita amizade. Também da tia Mercês e do ti Adolfo, do ti Mário da Bouça, do ti Malagueto, da Sra Hermínia, do ti João Mota, da tia Adélia Cega, da tia Amélia Garimpa, do Charralha e da mulher, do ti Chico Patatas e claro do Albino ou dos Chachos.
Lembro-me muitas vezes do Lelo, porque a sua partida revoltou-me, porque nos privou de um bom amigo. Também nunca me esqueço da tia Lita e do seu filho, o Carlos, duas jóias de pessoas, que tinham sempre a casa aberta para os amigos da terra.
Embora não tivesse tanta confiança com eles e certamente menos amizade, lembro-me também de muitos outros de que será difícil escrever aqui os nomes todos. O Norberto, a tia Marquinhas, o ti Serrador, o Chaniscas, o ti Trinta e a tia Ana, da tia Carvalheiras e de tantos outros.
Lembro-me de quase todos e por vezes surpreendo-me a comparar os filhos ou os netos com essa gente simples, de bom coração, trabalhadora. Os tempos mudaram muito e por vezes tenho saudades da solidariedade dessa época, da amizade que existia, da mentalidade simples, consequência do nosso estado de pobreza e isolamento da aldeia.
Costumo dizer que os tempos de agora são melhores e é verdade. Porém, é pena que não tenhamos guardado algumas das boas coisas que havia nessa altura.
Com o tempo, as caras vão desaparecendo das minhas recordações, como se o sol as fizesse ficar amarelas, como fotografias de outros tempos.
Espero que um dia, muito brevemente, alguém se deia ao trabalho de tirar uma ou duas fotografias a cada pessoa de Vale de Telhas, para que se guarde uma recordação dos corpos, quando só já estiverem presentes os espíritos. Uma fotografia do rosto, outra do corpo, que um dia, daqui a cinquenta ou a duzentos anos, poderão fazer parte da história da nossa aldeia.
Porque lhes falei aqui dos mortos ?
Porque fizeram e fazem parte da nossa vida, porque são parte de nós. Porque o futuro tem que ter raízes, como uma árvore. Ninguém pode construir a sua vida se não sabe de onde vem. Somos diferentes mas temos raízes comuns.
E por vezes esquecemo-nos que somos uma aldeia, somos um povo, somos uma grande família.
Somos Vale de Telhas !


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